A ADAPTAÇÃO CINEMATOGRÁFICA DE TEXTOS LITERÁRIOS

Sérgio Paulo Guimarães de Sousa

 

É corrente entre espectadores-leitores e autores adaptados, a avaliação e reivindicação da transposição fílmica de textos literários fazer-se a partir, quase exclusivamente, do critério da fidelidade, como se este fosse capaz de categorizar validamente todos os fenómenos psicológicos, sócio-culturais e intersemióticos envolvidos no processo da adaptação para o cinema da literatura.

Por vezes, a questão da fidelidade radicaliza-se em torno de exigências identificatórias que regulariam o processo de transposição. Adaptar para o ecrã seria então como que levar a cabo uma tradução literal. Uma cópia em sentido de decalque. Seria uma conformação da transposição no sentido de reprodução absoluta (identificante) do texto literário.

São vários os argumentos convocáveis para obstaculizar uma conceptualização e uma projecção da prática da adaptação fílmica nestes termos. Repare-se, desde logo, que a procura de fidelidade não constitui per se factor de refutação quando assumida pela singularização de uma adaptação. Cada realizador que adapta pode optar por aproximar-se das marcas semiótico-discursivas do texto literário ou emancipar-se delas, ainda que não totalmente, como adiante se verá. Em caso de fidelidade, esta constituirá, ao abrigo da produtividade textual, o que o realizador julgará ser uma transposição intersemiótica fiel do que leu, entendido sob o seu ponto de vista individual e pessoal. Daí que, como diria Gilbert Durand, "um texto nunca está dito uma vez por todas" (1982: 80). São, por essa razão, muitos os exemplos de adaptações cinematográficas que ilustram precisamente concretizações diferidas de uma mesma obra literária, sem que cada uma dessas transposições semióticas deixe de representar, para quem as realizou, uma fiel conversão em produto cinematográfico do que se leu.

Assim, proponho que se fale em fidelidades (ou, se preferirmos, em plurifidelidade), decorrentes da radicação do texto literário na finitude de contextos sócio-culturais, historicamente definíveis no tempo e no espaço. Estas dominantes circunstanciais eximem-no ontologicamente de uma interpretação imanente. Projectam-no para uma práxis exegética pluralista.

Pelo contrário, a teorização e categorização da adaptação em termos de uma fidelidade (podemo-nos referir à monofidelidade ou fidelidade absoluta), tal como é reivindicada quando se acusam certas transposições semióticas de traição, torna-se refutável. Pressupõe unicidade e homologia, como se o texto literário fosse provido de matéria expressiva e significativa verdadeira, válida e essencial. Advogar fidelidade literal ao texto supõe um monolitismo interpretativo, em que a verdade inequívoca e unívoca de cada texto existisse e fosse captável através do mandarinato de uma leitura atemporal e de validade universal, vale dizer, correcta e ortodoxa.

Adaptar, nestes termos, teria a ver com um processo monodalógico orientado por um organon de princípios metodológico-funcionais objectivamente válidos para aproximar o filme do livro. Significaria uma actividade intersemiótica concebida como operação de decodificação racional e objectiva de um determinado objecto literário, entendido como entidade de sentido estável e objectivamente verificável ("meaning"), e a sua respectiva conversão num correspondente filmo-semiótico. Um processo de tradução literal. Ora, nada de mais inviável do que pressupor a possibilidade de reproduzir num outro sistema estético o que "a priori" produtivamente multiplica e diversifica "concretizações".

Em suma, regular e fiscalizar esteticamente a adaptação cinematográfica em termos de estrita fidelidade ao texto literário apaga, teoreticamente, a conceptualização deste como entidade geradora de uma infinidade de potencialidades significativas procedentes da flexibilidade e criatividade da linguagem literária nos seus usos metafóricos e tropológicos. Contraria a noção, na esteira de Paul de Man e Derrida, da interpretação como errância pelas paragens do texto.

Torna-se, também, consequente e concomitantemente observável a nítida ausência, na crítica que julga as adaptações dogmaticamente sob o princípio da literalidade, de um valor tão fundamental como o da recepção. As potencialidades significativas em termos de adaptação do realizador (um hermeneuta que interage com o texto que transpõe) rasuram-se do processo. A estrita fidelidade à intenção textual literária conduz à conversão do sujeito responsável pela adaptação num leitor desprovido de reacções afectivo-volitivas (de expectativas, "pré-juízos" ou "pré-conceitos", segundo a terminologia gadameriana), e de uma contextualidade histórico-temporal. Quer dizer: não se constata que o fenómeno literário se altera em função de quem adapta, ser condicionado tanto por factores atinentes à sua individualidade, como circunstanciado por imposições externas de natureza empírica e sócio-cultural. Ficam razoavelmente distantes as suas respostas emotivas e identificatórias. Diríamos que o eu adaptante (em rigor, no cinema, falar-se-á de vários eus) sofre de um impedimento que lhe confere teoreticamente invisibilidade e insignificância heurística: o de se exteriorizar em "input interpretativo" (Hoy, 1982: 53).

Exigir fidelidade literal ao que se adapta constitui, igualmente, uma forma de legitimar algum "fundamentalismo autoral". Muitos escritores censuram o cinema sempre que se sentem traídos por uma adaptação e esta se lhes afigura incapaz de transmitir o sentido textual que julga(va)m possuir em absoluto. Negam, assim, a hermeneutização pluralista dos textos literários que escreveram. Rejeitam a possibilidade de serem lidos de formas diferenciadas e multívocas.

Umberto Eco, na linha de Barthes e Derrida, diz-nos justamente da necessidade de o autor "morrer depois de ter escrito. Para não perturbar o caminho do texto" (1984: 14). Desta forma, cabe ao produtor de literatura apagar-se em prol de leituras plurais que a capacidade produtiva dos textos solicita de maneira a não cair em tentação autoral de fixar o sentido dos textos que produz. Não lhe cumpre, em definitivo e totalmente, exaurir as correlações - univocamente codificadas e por codificar - entre funções sígnicas e entidades semânticas ("close reading") que os textos apresentam. Caber-lhe-á, ao autor, ceder o "seu" texto ao cinema, esperando da sétima arte desempenhos interpretativos que briguem com o(s) sentido(s) desse texto, que o enriqueçam com um constante "conflito de interpretações" (para usar palavras de Paul Ricoeur), (re)conduzindo dinamicamente a sua produtividade significativa para novos trajectos de libertação da sua Caixa de Pandora. Essa multiplicidade de leituras (e nenhuma detém a supremacia utópica de esgotar o potencial significativo da matéria literária) é incontornável. Nesse sentido, podemos dizer, partindo do processo de transposição fílmica como operação intersemiótica que comporta uma leitura literária, e porque o cinema pode justamente ser usado na elaboração de leituras possíveis do texto literário (cf. Cardoso, 1995/6: 26), que adaptar assume-se inquestionavelmente como uma re-escrita (re-interpretação) (cf. Monegal, 1993: 108-9). Por essa razão, "um escritor não deve fornecer interpretações da sua própria obra, senão não escreveria um romance, que é uma máquina de criar interpretações" (Eco, 1984: 10).

Em suma, a fidelidade que patenteia a crítica, sempre que acusa de traição as transposições semióticas que não reivindicam tradução literal da literatura, supõe um frontal desalinho com a "ideia de que existe na obra de arte uma substância que dela se desvincula e paira como gratuita oferenda à utilização por parte de quem a recolhe" (Coutinho, 1996: 21).

A plena consciência da utopia (ou aporia) de uma fidelidade entendida em termos absolutos tem, por sua vez, levado a purismos radicais sacralizantes do objecto literário como entidade intocável pela sétima arte. De facto, autores há que interditam a transcodificação dos seus livros para a tela, por se acharem abusivamente "colonizados", digamos assim, pelas modificações (em termos de omissão, acréscimo, reformulação) implicadas num processo de adaptação.

Do lado da crítica, a esconjuração da adaptação cinematográfica tem-se argumentado a partir de uma explícita defesa de um "cinema puro" (cf. Valéry apud Clair, 1970: 41-42), dotado de particularidades expressivas, singularmente diferenciáveis das da literatura. Por esse motivo, tornar-se-ia débil a capacidade da sétima arte expressar pelos seus meios o objecto literário, como defendeu Chklovski (cf. 1971: 45; e poderíamos citar, com a mesma postura, George-Albert Astre, cf. 1958: 142), procurando mostrar o heteromorfismo que separa a literatura do cinema.

Outros autores, como Claude Gauteur (cf. 1958: 209 e 211), ligeiramente mais flexíveis, dissipam um pouco este separatismo, restringindo-o apenas a alguns textos maiores da literatura (os valores patrimoniais do cânone), interditados de submeterem os seus comportamentos narrativos e discursivos à percepção visual do cinema.

Noutros casos, a lógica da separação entre o adaptável e o inadaptável obedece à maior ou menor proximidade entre a sintagmática e a gramática do cinema e a do objecto literário. Nestes termos, apropriar-se-ia à transposição intersemiótica preferencialmente material literário que mantivesse certas afinidades com o texto fílmico, que estivesse construído "cinematograficamente" (cf. Ramió, 1991: 28-9). Isto é, "a novel that is already covertly narrated, totally or predominantly "shown" by a camera eye" (Chatman, 1990: 164), ou romances de acção desprovidos, em geral, de processos mentais, análises psicológicas introspectivas e subtilezas conceptuais que a linguagem cinematográfica tem dificuldade em retratar.

Destas carências expressivas do cinema tem resultado, aliás, no âmbito precisamente de uma comparação entre cinema e literatura efectuada, a partir da óptica da adaptação, uma inferiorização teórica da sétima arte. A literatura possuiria "[...] una riqueza incomparablemente mayor que el del cine; su técnica artística, casi inconmensurable" (Ayala, 1996: 89). A transposição intersemiótica teria permitido rastrear, como escreve René Micha (apud Peña-Ardid, 1992: 23), "quelques uns des pouvoirs et des défauts du cinéma: elle en a dit la présente et provisoire infériorité: elle a souligné l’importance unique du langage". A desvalorização do cinema fica-se também a dever às condições da sua produção e da sua recepção. Sublinhe-se que, nos seus primórdios, a sétima arte era privilegiadamente "consumida" por um público de baixo nível cultural. Como escreve Raymond Queneau, "Le cinéma en dehors des milieux intelectuels est né dans les kermesses, a vécu dans les faubourgs et s’est épanoui sans l’aide des gens cultivés" (Queneau apud Clair, 1970: 310).

Estes purismos radicais, referentes quer à totalidade do cinema e da literatura, quer parcialmente aos valores canónicos destes sistemas semióticos ou então reservados a objectos literários técnico-compositivamente "pouco cinematográficos", foram contestados, nos finais da década de 40 e inícios dos anos 50. Sobretudo por críticos como Alexandre Astruc (cf. 1948 e 1948a), autor da famosa designação de "Caméra-stylo", e, principalmente, André Bazin.

Em "Pour un cinéma impur" e "Le Journal d’un curé de campagne et la stylistique de Robert Bresson", ensaios inicialmente publicados na década de 50, Bazin prossegue a tradição crítica que concebe a adaptação cinematográfica como um processo empenhado em reproduzir fielmente o objecto literário. Mas alarga o âmbito do conceito de "fidelidade". Propõe que adaptar seria a busca criativa de equivalentes fílmicos do texto literário. Esta ampliação conceptual da fidelidade acha-se igualmente visível, por exemplo, em Joy Gould Boyum. Em Double Exposure: Fiction into Film (1985), Boym fundamenta que, tratando-se de textos clássicos, o filme deve manter-se fiel à "vox" textual do objecto literário. Teria como base de apoio, digamos assim, a(s) leitura(s) encetada(s) pela "comunidade interpretativa" do respectivo texto.

Uma operação de adaptação fílmica de um texto literário envolve necessariamente a transmutação de níveis narratológicos, embora de forma múltipla quanto ao grau das alterações, em conformidade com parâmetros/factores variados.

Ora, sempre que se debate a temática da transcodificação fílmica de literatura, irremediavelmente, surge a problemática do grau de fidelidade ao texto-original, como critério de valoração e aceitação da qualidade da transposição intersemiótica. Tentemos dilucidar esta questão. Demarcar o sedentário do maleável.

A esse respeito, como vimos, quer Boyum, quer Bazin dilatam os limites da fidelidade prevendo a possibilidade de leituras plurais, limitadas, no entanto, na sua legibilidade por orientações/restrições que direccionam as possíveis adaptações semânticas levadas a cabo pelo cinema, parecendo assim evitar qualquer tipo de adaptação e riscos de pulverizações subjectivistas anarquizantes. Efectivamente, se, por um lado, o crítico francês postula a fidelidade ao texto literário em termos de procura de equivalências cinematográficas procedentes do talento inventivo e imaginativo pessoal e individual (cf. 1985: 107), i.e., por concretizações múltiplas (as tais fidelidades), por outro, restringe as possibilidades dessa liberdade trans-semiótica. Define limites para o universo da adaptação mediante a desvalorização estética da infidelidade às marcas semiótico-discursivas do objecto literário, manifestando, desta forma, justamente receios de traição, de subjectivismo. O mesmo se passa com Boyum, quando este autor se propõe falar em leituras "válidas" e, na esteira de Stanley Fish, de "comunidades interpretativas" ou quando escreve que "I’ve already suggested that a film might be considered faithful to its source to the extent that is implicit reading remained within the confines of that work’s interpretative possibilities, to the extent that is neither violated or diminished them" (1985: 77).

A questão que se coloca é a de saber se, em situação de adaptação fílmica, a literatura dispõe da legitimidade de se resguardar de possíveis relativismos e licenciosidades hermenêuticas que possam ocorrer em contexto cinematográfico através de apropriações indevidas do sentido textual do objecto literário. De facto, parece fazer sentido considerar que um livro transposto ao cinema se pode eventualmente sujeitar a liberdades transfigurantes deste, degeneráveis em práticas de leitura radicais de tipo anárquico e subjectivista que "abram" de tal modo a obra literária ao ponto de lhe desconstruírem a arquitectura textual em decisões interpretativas narrativamente infelizes e equiparáveis ao princípio de que "anything goes". E o que estará aqui em causa é saber justamente se uma adaptação cinematográfica se pode conceber arbitrariamente pela escolha de "percursos de leitura" deliberadamente despromovidos pelo texto que adapta, i.e., fazer-se a despeito dos predicados ontológico-funcionais e das actualizações semânticas para as quais estes apontam.

A resposta a esta indagação obriga a considerar a separação entre o ler e o adaptar.

Em contexto académico-escolar ou simplesmente de leitura corrente, o objecto literário deve entender-se como "uma entidade passível de leituras plurais, mas não de quaisquer leituras" (Azevedo, 1995: 13). Com efeito, efectiva-se na literatura um "modelo dialógico, bi-activo" (Aguiar e Silva, 1990: 94). Quer isto pressupor que, por um lado, é dada ao leitor a possibilidade de actuar heurística e hermeneuticamente numa "larga zona de liberdade semiótica" (idem: 93). É-lhe permitido exercer uma actividade inferencial (através de raciocínios probabilísticos), de modo a desambiguizar os labirintos textuais, já que "na estrutura do texto manifestam-se vazios, buracos, que o leitor tem de preencher, combinando e conectando diferentes segmentos ou porções do texto" (idem: 94). Mas, por outro lado, impõem-se-lhe instruções semiótico-discursivas que o autorizam a activar determinados quadros de referência, a despeito de outros, na obtenção de uma leitura que vise uma coerência textual, narrativamente, pertinente (Azevedo, 1995: 60). Desta maneira, evita-se a "sacralização do leitor como um ser omnipotente, omnisciente e omnividente" em "busca incessante, incontrolável e infinita de significados" (idem: 13). Esconjuram-se tentações de subjectividade, relativismo e/ou arbitrariedade.

Em regime de adaptação deve ter-se em conta que se está em contexto de arte que procura não só uma interpretação do objecto literário (é inacreditável que um realizador possa adaptar sem interpretar o que adapta), mas essencialmente a sua reconfiguração estética. Daí que o fenómeno da transposição fílmica, citando Aldo Viganò, "è "condannata" a coinvolgere sempre e necessariamente il problema della creatività" (1996: 27). De facto, efectiva-se na adaptação uma liberdade trans-semiótica suficientemente ampla de quem adapta para originar modificações mais ou menos abrangentes do texto literário. O realizador que adapta literatura distancia-se do leitor que a lê, já que procede a um redimensionar do livro numa nova obra de arte. Sendo em arte ilimitada a liberdade de criar, não se pode pensar em regulamentações ou instruções estritas sempre que a sétima arte escolha fazer-se a partir da literatura, com excepção feita para casos concernentes à pré-definição ontológica da obra a produzir.

Deste modo, a literatura que o cinema escolha adaptar posiciona-se como um material estético destinado a um outro campo da estética, no qual poderá beneficiar real ou potencialmente de uma modelização, pois que todo o sistema estético-expressivo funciona na base da criação/invenção. Diríamos que o cinema está para a literatura que adapta (modeliza) como a literatura está para a realidade que modeliza (adapta), embora "todo o universo ficcional se baseie parasitariamente no mundo real, que constitui o fundo daquele" (Eco, 1994: 99).

Quando o cinema escolhe operar a partir de um outro sistema modelizante secundário, ele escolhe construir-se sobre ele (e não nele), o que invalida, desde logo, qualquer tentativa identificatória, no sentido de um cinema que nada faria senão (re)produzir "imagens animadas a «ilustrarem» um romance sem nada interpretarem dele ou lhe acrescentarem" (Nobre, [19--]: 187). Além disso, se a literatura modeliza o real ficcionalizando, é de pressupor que o cinema use com legitimidade o direito de modelizar o literário ficcionalizando, como se de real se tratasse (Balász apud Astre, 1958: 148).

Assim sendo, as proposições teoréticas de Bazin, que fazem depender a valoração estética de um filme da sua capacidade de transcodificar para o ecrã reprodutivamente o objecto literário, por procura de equivalências cinematográficas, e as de Boyum, por uma legibilidade confinada às possibilidades interpretativas que instruções pragmo-semânticas e "comunidades interpretativas" do texto legitimam, perdem pertinência. Torna-se inaceitável invalidar esteticamente uma adaptação sempre que se manifeste ausência de fidelidade.

Equacionar esteticamente a adaptação em proporção da fidelidade exclui, pois, transposições semióticas que, de uma maneira ou de outra, transfiguram criativamente o objecto literário, independentemente do seu real valor expressivo. Ora, com frequência, o cinema que adapta depara-se com filmes ancorados em "fidelidades" estéreis e "traições" fecundas, na justa medida em que nem sempre a melhor adaptação é a mais fiel (Gimferrer, 1985: 62).

Além disso, se a fidelidade à intenção textual não proceder de uma opção estética, validada por uma vontade individual e pessoal e, por isso, eminentemente subjectivada por expectativas, pré-juízos e pré-conceitos, mas resultar de imposição, convém interrogar: a que aspectos da obra literária essa obrigatoriedade solicita fidelidade? Com efeito, dada a complexidade da entidade textual literária, constituída por múltiplos códigos e subcódigos em dinâmica intersistémica e intrasistémica (cf. Aguiar e Silva, 1990: 58), o cinema pode, de um modo plural e variável, privilegiadamente fidelizar-se a determinadas marcas semiótico-discursivas em detrimento de outras. Pode escolher, por exemplo, tentar transpor com exactidão o ritmo interno de uma obra sem procurar para tal uma adaptação à "letra" desta. Nesse sentido se compreende a poli-receptividade subjacente a qualquer transposição intersemiótica no que concerne à determinação do seu grau de fidelidade.

De resto, não esqueçamos que a adaptação para o cinema do texto literário dá normalmente lugar a operações de transacção comercial. A literatura negoceia a cedência ao cinema de direitos autorais. E quando a sétima arte compra, em geral a preços exorbitantes, o direito de propriedade de uma obra de literatura, fá-lo no sentido de a explorar de acordo com os contextos e as situações convencionadas que rodeiam a produção da narrativa fílmica. E, de facto, dispõe desse direito (Geada, 1998: 43; vide ainda Gardies, 1999: 105, Mourlet, 1958: 206, Boyum, 1985: 64).

Por tudo o que fica dito, compreende-se, como escreve Linda Seger (1992: 38), que uma adaptação seja um novo original. Quer dizer, citando as palavras de Juan Marsé (1994: 34), "En definitiva, la película será conveniente no por su fidelidad al argumento o al espíritu de la novela que adapta, sino por su acierto en la creación de un mundo propio, específico y autosuficiente, con sus propias leyes narrativas" (1994: 34).

É de salientar que a refutação, que terminamos de expor, do critério da fidelidade não supõe nem legitima, todavia, um entendimento da adaptação fílmica de textos literários como processo intersemiótico totalmente livre e ilimitado nas suas possibilidades derivativas/recriativas. Discordamos, portanto, de posturas que defendam que "El texto escrito no exige otra fidelidad que la de ser leído con libertad y creatividad" (Jiménez, 1996: 62).

Se assim não fosse, tomaríamos por adaptações relacionamentos transtextuais apenas baseados na motivação criativa, na inspiração. Assim, mesmo sendo, como tentámos mostrar, a fidelidade dispensável em prol de (in)fidelidades, devemos ter em atenção que adaptar não significa, em conformidade com motivações várias, simplesmente inspirar-se "en la literatura para recrear un mundo, o parte de un mundo, ajeno a él" (Gortari & Barbáchano, 1985: 53). Diríamos, seguindo Imanol Zumalde (1997, 29-41), que este tipo de relacionamento transtextual dirá respeito à noção genettiana de hipertextualidade, conceito simultaneamente mais amplo e mais restrito do que a adaptação. De facto, por um lado, a adaptação ultrapassa a prática hipertextual, dado que embora esta refira uma relação de transformação ou de reduplicação entre um texto B (hipertexto) e um texto anterior A (hipotexto), ela não pressupõe a admissão de vínculos, entre hipotexto e hipertexto, que não sejam de natureza inter-linguística e literária. Ora, a noção de adaptação baseia-se em relações interestéticas e heteromórficas, i.e., que co-envolvem sistemas estético-semióticos diferenciados. Por outro lado, uma operação de adaptação fílmica de um texto literário não abarca a abrangência do relacionamento transtextual possível entre um hipotexto e um hipertexto, relacionamento esse que, como sublinha Zumalde, só exceptua o comentário, próprio da metatextualidade. A noção de hipertextualidade excede as margens que confinam a transposição fílmica (e, de forma geral, intersemiótica).

A demarcação do território da adaptação, ou seja, das suas possibilidades e limites situa-se na sua discriminação da prática hipertextual. Da zona de diferenciação obtida, Zumalde enumera princípios pelos quais se rege e confina a transposição:

1 - a adaptação contempla relações intersemióticas entre dois textos (o texto-original/fonte e a adaptação deste), enquanto que a hipertextualidade admite, ainda que Genette o não faça de forma explícita, tanto uma pluralidade de hipertextos para um hipotexto, como vários hipotextos para um hipertexto;

2 - a relação hipertextual, prática extensa e congénita à literatura, pois que toda a obra literária potencia a evocação de outras, não implica a explicitação do hipotexto (texto de origem/fonte), assim como do grau de transformação operado neste. Em contexto de adaptação, pelo contrário, esta e o texto-fonte explicitam-se em declaração paratextual. Manifesta-se que a obra apresentada consiste numa transposição intersemiótica de um texto-original, cuja referência surge como garantia. Não se trata, como salienta Zumalde, de uma imposição intrínseca à operação da adaptação, mas antes de uma atitude deontológica;

3 – o coeficiente global de derivação semântico-formal sustentado por uma adaptação não deve ser tal que converta esta num exercício de liberdade artístico-semiótica apenas inspirado/motivado num material textual pré-existente. Entre este e a sua adaptação reclama-se uma relação estético-semântica umbilical/filial, mesmo sabendo-se que o respeito a um texto-original se afigura como aspecto passível de flutuações em função de avaliações subjectivo-pessoais (veja-se o caso das denominadas "adaptações livres"). Zumalde define-nos semioticamente o processo de adaptação como sendo o prolongamento e a ampliação da essência originária de um texto-fonte. Dito de outra forma: o texto adaptado procede à renovação e duplicação da imanência do original. Nesse sentido, Zumalde recorre à terminologia de genotexto para indicar a génese do texto adaptado e ao termo endotexto, texto que se mantém no interior do genotexto, para designar o texto transposto. A verificação da duplicação ou prolongamento da essência/imanência (conceito "a priori" subjectivo) de um texto verbal, por parte de um texto fílmico, tem a ver com a determinação do grau de derivação a nível semântico-narrativo e discursivo operado entre tal texto-fonte e esse texto fílmico. Se o coeficiente ou grau de derivação for de tal ordem que as estruturas semântico-narrativas e discursivas do texto literário se encontrem praticamente subvertidas no texto fílmico, sobrando apenas, neste, a presença de uma ou outra mera referência ao texto-original, não estaremos, com certeza, frente a uma adaptação, mas tão somente perante uma criação cinematográfica original, pontualmente inspirada num texto literário;

4 - em consequência e conformidade com o ponto 3, a adaptação cinematográfica de um genotexto literário deve ser legitimada por este, de forma a desconsiderar-se, do âmbito da transposição fílmica, aquelas relações transtextuais que compreendem qualquer tipo de transformações/derivações, em grau e quantidade, e que, por essa razão, se constituem como exercício hipertextual. Esta legitimação, ou autoridade paternal, de um genotexto sobre o seu endotexto não se equaciona, como defendemos, com questões de maior ou menor fidelidade ao texto-original. Qualquer transposição fílmica, como se disse, pode dar azo a transformações próprias, motivadas, entre outros factores, quer pela liberdade artístico-criativa de quem adapta, quer pelos múltiplos e variados estímulos interpretativos que um genotexto literário suscita. Cada texto literário evidencia uma infinidade de potencialidades genotextuais. Entende-se por adaptação legitimada pelo genotexto aquela transposição intersemiótica que, apesar de significar a prática de uma liberdade construtiva de forte incidência criativa que recria e transfigura em níveis e graus variados, não quebra, como diria Zumalde, a imanência duplicada. Assim, muitos textos fílmicos, embora tenham como matriz ou elemento gerador um texto literário, não se podem considerar adaptações deste.

5 – Zumalde aponta uma última característica: a leitura relacional e retrospectiva do endotexto à luz do texto-original. É de notar que a leitura relacional não se confina à transposição intersemiótica. A leitura de um hipertexto por referência ao seu hipotexto enriquece a produtividade textual deste. No entanto, ela não se assevera tão imperiosa quanto no caso da adaptação, devido ao facto de neste processo derivativo se substanciar uma ampliação da imanência ou essência de um texto-original. Refira-se, todavia, que a noção de leitura relacional mesmo aí apenas se aplica a um leitor modelo, não abrangendo a totalidade dos espectadores empíricos, já que nem todos conhecerão o genotexto literário.

É de notar que estes traços acima referidos, pelos quais se marca a fronteira entre uma operação de adaptação e uma relação transtextual de motivação criativa/inspiração (ou seja, a determinação do grau ou nível mínimo de fidelidade requerido para que um relacionamento transtextual se considere exercício de transposição fílmica), têm sobretudo a ver com a noção zumaldiana, ainda não elucidada, de essência originária ou imanência de um texto-fonte.

Depreende-se que esta noção se correlaciona com o nível ab quo da teoria metassemiótica greimasiana do percurso gerativo do texto, modelo teorético que Zumalde convoca para circunscrever justamente os limites e as possibilidades do fenómeno da adaptação cinematográfica. Este autor, com o qual concordamos, apenas considera como operação de transposição intersemiótica as transcodificações que preservem aquele estádio profundo e fundamental do genotexto que encerra a estrutura elementar da significação e que Greimas representa visualmente sob forma de quadrado semiótico. De facto, qualquer que seja a transformação ou modificação concretizada nos valores sémicos deste nível imanente, esta desencadeia derivações nos níveis ulteriores do percurso gerativo que transcendem os limites impostos pela adaptação. Trata-se assim de desconsiderar aqueles, como já dissemos, exercícios transtextuais em que o texto-original desempenha a função de motivo inspirador e é tomado, nas palavras de Pedro Barbosa (1985: 58), como "núcleo germinativo". A noção de fidelidade semântica acha, portanto, aplicação ao nível profundo e elementar do texto-fonte. Garante-se, assim, a reprodução dos valores semânticos mínimos sob os quais assenta a base sémico-formal deste. Respeitam-se as relações, operações e transformações básicas que o esquema narrativo do texto-original estrutura. Como escreve Zumalde: "El acatamiento a ese mínimo esquema semántico del genotexto es la garantía de la [...] A[daptação] como ejercicio textual reconocible" (1997: 92-3). Pensamos que é justamente nesse nível do núcleo ou embrião semântico original, nessa zona mais abstracta, que reside a imanência/essência de que nos fala Zumalde, que reside o "microcosmos narrativo" (expressão de Farcy, 1993: 399), núcleo central não-maleável/sedentário.

Fora desse âmbito, e pelas razões que já referimos, tornam-se aceitáveis variações e infidelidades (tal como a procura de fidelidade, note-se). A transfiguração/ derivação do texto-original pode logo principiar no nível das estruturas semionarrativas correspondente à gramática narrativa de superfície, através da modificação das funções dos actantes. Trata-se de entidades abstractas que dinamizam as operações e relações lógico-conceptuais do nível acrónico da gramática fundamental e que se definem pela sua intervenção relacional no seio do programa narrativo. As derivações registam-se também com elevada frequência em níveis ulteriores. Cingindo-nos ao nível subsequente, o da manifestação discursiva, podemos apontar como exemplificativos de alterações (por repetição, supressão, ampliação e diminuição, segundo as regras do comparatismo) aquelas situações fílmicas em que os actores que individuam as categorias actanciais do texto-original não correspondem em absoluto (em termos de aspecto antropométrico, idade, carácter ético-afectivo, nacionalidade, função sócio-cultural, etc.) àqueles que no texto literário objectivam essas mesmas categorias; assim como casos de transfiguração assente na modificação do contexto espácio-temporal dos eventos comportados pelo programa narrativo.

Importa, tendo por base que qualquer prática de transposição fílmica deve retomar as operações e relações lógico-conceptuais que reproduzem/decalcam a significação da estrutura elementar do significado do texto-original (conteúdo imanente/essencial), atentar sobre os múltiplos factores que interferem proteicamente (transformam, enriquecem) no fenómeno intersemiótico.

A par de uma fidelidade intrínseca ao núcleo semântico seminal/original do texto-fonte, uma adaptação fílmica afirma-se como mais-valia semântica. É lugar de recriação subjectiva, onde se evidencia, de forma mais ou menos manifesta, uma experiência de apropriação. Cruzam-se, com o horizonte semântico-formal do texto-fonte, movimentos sócio-históricos, contextos psico-culturais e procedimentos estruturo-formais. É neste entroncamento que parece residir o interesse de estudar a adaptação cinematográfica de textos literários. Aí se originam níveis de transfiguração múltiplos, relativamente ao texto-fonte (estruturas ulteriores ao nível da gramática fundamental).

Apesar das restrições apontadas ao critério da fidelidade (a qual, seguindo Zumalde, confinámos ao nível das estruturas semionarrativas que Greimas designou como sendo o da gramática fundamental) e da centralidade recriativa que assumem tanto factores ambientais psico-sócio-culturais, como factores de natureza expressiva (significante/comunicante da matéria audiovisual), tem sido em redor precisamente da fidelidade que parte das categorizações, sobretudo dicotómicas e tricotómicas, académicas respeitantes à transposição intersemiótica se têm efectuado, desde Bazin até aos nossos dias. Podemos referir, para mencionar somente os mais significativos, sem entrar em explanações (para isso vide Sousa, 2000: 22-25), Beja Morris (1972: 82), Étienne Fuzellier (1964: 131-5), Geofrey Wagner (1975: 222-231), Michael Klein e Gillian Parker (1981: 9-10), Luís Quesada (1986: 11-12), Dudley Andrew (1984), François Truffaut (1958: 243-244), Alain Garcia (1990).

Todas estas categorizações e outras (como as de Pío Baldelli, cf. 1964, e Gianfranco Bettetini, cf. [19--]) constituíram um esforço considerável no sentido de classificar em distintas tipologias a ampla gama de variantes que a longa história das transposições fílmicas gerou, como assinala Peña-Ardid (cf. 1992: 27). Porém, ao nuclearizarem a sua atenção apenas no grau de fidelidade que o filme produzido mantém para com o livro transposto, quase todas revelam insuficiência descritivo-

-explicativa no tratamento do fenómeno intersemiótico da adaptação.

Com efeito, o critério da fidelidade e a subordinação do texto fílmico ao literário que lhe é latente, repita-se em jeito de conclusão, não dão explicitamente conta, em primeiro lugar, das particularidades hiléticas do sistema cinematográfico que impossibilitam uma identificação da transposição intersemiótica como um processo de transferência de um significante/comunicante literário para uma forma expressiva cinematográfica de uma propriedade semântica imutável. Pelo contrário: transpor para a tela supõe, logo à partida, que a entidade adaptada pelo cinema se sujeite a mutabilidades e modulações impostas por especificidades hiléticas da linguagem fílmica.

Em segundo lugar, encerra-se nesta concepção da adaptação vulnerabilidade, dado que não se atende, com explicitude, às relações crítico-dialógicas que, em regime de transposição intersemiótica, o cinema estabelece com os livros que transpõe. As preocupações de fidelidade secundarizam o carácter histórico de qualquer transposição intersemiótica. Tendem a rasurar o facto de que nenhum fenómeno semiótico e intersemiótico é totalmente indiferente a uma interacção inextricável entre o ponto de vista individual e pessoal de quem produz circularidade intersemiósica e o ponto de vista do seu contexto, já que todo o indivíduo integra uma concretude temporo-espacial. Localiza-se e inscreve-se no seio de dominantes que constituem a historicidade de uma conjuntura. Por essa razão, qualquer transposição fílmica é condicionada e configurada por uma tradição sócio-estética, histórico-cultural e geo-político-económica.

Pensamos, tendo presente o acima exposto, que a classificação tipológica das diferentes modalidades da adaptação na base do critério da fidelidade pode levar implicitamente a considerar o fenómeno da transcodificação (nos diferentes níveis de significação que presidem à construção do seu significado textual, desde o nível da gramática fundamental até aos restantes que apontámos como sendo passíveis de legítima transfiguração, os da gramática de superfície e das estruturas discursivas e textuais), sob o espectro da transferência fiel/reprodutiva do texto-original à tela. Ora, interessa relevar e destacar os aspectos transfigurantes (a bela infidelidade), motivados por razões várias, que a adaptação sobrepõe ao núcleo semântico de base do texto literário (gramática profunda). Destes surte a fecundidade do fenómeno da transposição fílmica e o seu estigma como processo marcadamente recriador.

Nesse âmbito se têm pronunciado recentes teorizações da transposição Assim, nomes como, salientando alguns dos mais relevantes, Georges Bluestone (Novels into Film, 1957), Neil Syniard (Filming Literature. The Art of Screen Adaptation, 1986), as francesas Monique Carcaud-Macaire e Jeanne-Marie Clerc (Pour une Lecture Sociocritique de l’Adaptation Cinématographique, 1995) ou o canadiano Patrick Cattrysse (Pour une Theorie de l’Adaptation Filmique. Le film noir américain, 1992) têm procurado demonstrar a irrelevância da circunscrição da adaptação a partir das noções de "fidelidade" ou "traição", conceitos próprios de instrumentos ou mecanismos de tradução e transferência. Pelo contrário, enfatizam a adaptação fílmica como um fenómeno intersemiótico dinâmico e multidimensional, quer dizer um fenómeno recriador, capaz de gerar novas funções sígnicas e de conferir, por transfiguração/reconfiguração, mobilidade semiótica nas marcas pragmo-semânticas do texto literário. Sublinham, em resumo, a compreensão do diálogo frutuoso que as constrições hiléticas da sétima arte e o horizonte sócio-esférico da adaptação (resultado mediato de circunstâncias estéticas e ideológico-culturais em permanente trânsito) estabelecem com o horizonte textual da literatura. Em resumo, consideram três tipos de componentes, exógenas ao texto-original e inextricáveis:

1) componente psico-subjectiva de quem transpõe, entidade interpretante (individual e/ou plural) que tecerá uma leitura crítica (subjective) do texto que filma, a qual lhe permitirá descortinar um horizonte de "mundos possíveis";

2) componente contextual, relativa aos códigos (intra e inter)estéticos e às modelações decorrentes das "series" (Tynianov, 1972) extra-artísticas (códigos vigentes histórico-culturais, sócio-ideológicos, político-económicos, etc.) de quem adapta, entidade temporalizada numa sócio-esfera da qual se indissocia e que, por isso, desempenha uma intereferência relevante na operação intersemiótica;

3) modificações que se prendem com a especificidade da linguagem cinematográfica (particularidades hiléticas do registo fílmico), significativamente diferenciadas do(s) código(s) da literatura.

Em suma, colocam em evidência, como escreve Brian McFarlane (1996: 11), que "There are many kinds of relations which many exist between film and literature, and fidelity is only one – and rarely the most exciting".

 

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O DESAFIO DO DIÁLOGO INTERCÓDIGOS NA FORMAÇÃO DO LEITOR (2007)

                                           Profa. Dra. Maria Zilda da Cunha/USP

 

 I Introduzindo a questão ou “Pra começo de conversa

 

            Falar em leitura como processo comunicativo nos dias atuais nos leva, mesmo que de forma muito breve, a uma visada ao mundo contemporâneo. Mundo no qual, queiramos ou não, estamos inseridos e, sem que possamos controlar, participamos de revoluções tecnológicas, que em bases inéditas, transformam nossas relações com o outro, com nós mesmos, com as linguagens, com o próprio conhecimento.

            Estamos envolvidos por um universo visual/sonoro das linguagens televisiva, fílmica, radiofônica, dos clips, da publicidade, das histórias em quadrinhos, dos celulares, dos jogos eletrônicos, do vídeo texto, do computador, etc. que vem gerando novos hábitos de percepção e de interação nas áreas da educação, do trabalho, lazer, entretenimento.

As tecnologias recentes que disseminam informações têm caráter interativo, os novos meios de produção de imagens, os novos alfabetos de luzes da computação gráfica inauguram uma era hipercomplexa. Somos uma sociedade sem fios conectada por meio de informações, via uma rede urdida interplanetária de telefonia e de sensores óticos interligando e formando um ciberespaço.

Diante de tudo isso cabe indagar como ficamos nós, nossas formas de pensamento e de linguagem, os suportes de linguagem que o homínida criou no perfazer de sua história, os meios de difusão de informação e de conhecimento. Como ficam enfim as formas de representação e de comunicação humanas.

Nessa ordem de idéias, para enfrentar uma discussão sobre leitura, literatura, e linguagem, sem nos apegarmos em formas anacrônicas, temos, no mínimo, de nos livrar de dois preconceitos:

 

·                    De que um novo meio de comunicação desintegra o anterior.

·                    De que a única forma de comunicação é a verbal.

 

Com relação ao primeiro aspecto, é inegável que todo e qualquer novo meio de produção de processos comunicativos providenciam novas formas de produção de leitura, novos conteúdos, novas formas de subjetividade, produzindo novas estruturas de pensamento e outras modalidades de apreensão e intelecção do mundo; é verdade também que o nascimento de um novo meio não leva à morte, nem desintegra aquele que o precedeu, a tendência, como assinala Santaella (1996), é a criação de sistemas integrais, interdependentes, de modo que um meio se alimenta do outro ao mesmo tempo em que o retroalimenta.

Com respeito à segunda questão, conforme sabemos o domínio da linguagem verbal – oral e escrita – é essencial. Ser usuário competente da linguagem escrita é hoje uma via de acesso fundamental para a integração do cidadão no tríplice universo do trabalho, da cultura simbólica e das relações sociais. A escrita constitui um instrumento valioso para o desvendamento das conexões que montam a teia de exploração do homem pelo homem.

Entretanto, a compreensão da realidade abarca um processo lógico, que ultrapassa os limites lingüísticos e envolve uma atividade semiótica no sentido lato, onde mais sistemas de signos se complementam reciprocamente.(Eco,1979) Além disso, toda a prática humana está inserida numa situação mais ampla, na medida em que se instala como elemento interferidor nos sistemas social, econômico e cultural, seja para confirmá-los ou alterá-los.(Ferrara, 1980). Portanto, é necessário alargar a compreensão de linguagem para além das fronteiras do verbal se quisermos compreender as linguagens que estão no mundo e nas quais estamos, uma vez que é no homem e pelo homem que se opera o processo de representação sígnica, enquanto produtos da consciência, o modo dessas representações revela a ação do sistema sócio-cultural sobre nossos pensamentos e condutas.

Sob esse enfoque, o funcionamento da cultura é inseparável da comunicação e um papel fundamental cabe aos meios de comunicação ou tecnologias de informação e comunicação ou aquilo que chamamos de mídias.

 Sendo assim, torna-se importante colocar sob mira as formas de produção de cultura instauradas pelo processo de comunicação midiático, posto que os processos comunicativos exercidos pelas mídias funcionam como atividades culturais, criando seus próprios sistemas modelares secundários (mitos, crenças, sistemas de leis), geram códigos específicos, produzem efeitos perceptivos peculiares, formas de recepção próprias e comportamentos sociais característicos.

Nessa ordem de idéias, importa investigar como esses sistemas se engendram e são processados para produzirem sentido, bem como se processam as relações dos fatos de poder e influência das inovações midiáticas sobre um movimento intelectual.